quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Boom em Miami

Brasileiro é motor por trás de boom do luxo em Miami

The Wall Street Journal, de Miami

Um volume inédito de dinheiro oriundo da América Latina está alimentando uma era de ouro para o luxo em Miami.
O apetite chinês por commodities produzidas na América do Sul, como petróleo, soja, cobre e trigo, criou um fluxo de riqueza que encontra, em uma Miami renascente, seu playground favorito. E, embora a cidade tenha sido durante décadas um entreposto da classe média latino-americana, um boom cultural recente e a leva de imóveis nobres que a explosão da crise imobiliária americana deixou órfã ajudam a atrair para ali representantes da nata latino-americana.
"A Flórida está bombando", disse Paulo Bacchi, presidente da fabricante brasileira de móveis Artefacto, que tem duas lojas na região de Miami, incluindo uma no Village of Merrick Park, um shopping center de luxo em Coral Gables popular entre estrangeiros. Cerca de um terço dos clientes da Artefacto na região são brasileiros que têm casa em Miami. Outro terço é formado por venezuelanos que se radicaram na Flórida para escapar da Revolução Bolivariana de Hugo Chávez. Bacchi, cujas lojas trabalham com incorporadoras e decoradores para mobiliar residências inteiras de clientes abastados, pretende abrir uma terceira loja em julho em Doral, uma cidade a oeste da região metropolitana de Miami na qual vivem muitos venezuelanos de alta renda.
Camille Thiry Russler, dona da Ever After Bridal Boutique, butique especializada em noivas no badalado Coconut Grove, disse que os latino-americanos são a única razão para a alta de 30% no faturamento entre 2008 e 2009, no auge da recessão americana. Em 2011, o salto foi de 60%. "Todo esse movimento adicional veio do tráfego internacional", sobretudo do Brasil, da Venezuela e do Panamá. Russler, cujos vestidos de noiva custam em média US$ 8.000, conta que nesse período "a clientela local encolheu".
A psicóloga Maria Gabriela Saadi, que mora em Porto Alegre, comprou seu vestido de noiva na Ever After. Saadi fez a peregrinação de oito horas até Miami duas vezes. A primeira, para escolher o vestido. A segunda, cinco meses depois, para buscá-lo. "A realidade no Brasil é a seguinte: você trabalha, trabalha, trabalha para ganhar dinheiro, e tudo é muito caro", disse. Já no sul da Flórida, segundo a brasileira, a variedade é grande e as coisas são muito mais baratas. Além disso, "a gente se sente em casa, pois é um lugar latino. Quando estamos em Miami, não nos sentimos nos Estados Unidos", disse Saadi.
A multidão de turistas latino-americanos em Miami, e o dinheiro que gastam aqui, atingiu níveis recordes. Mais de três milhões de latino-americanos visitaram a cidade em 2011, 7% a mais do que no ano anterior - e um número recorde. Os brasileiros, que em 2011 gastaram US$ 1,3 bilhão na economia de Miami - mais do que qualquer outra nacionalidade -, também foram os mais numerosos: mais de 634.000 brasileiros, de acordo com a Secretaria de Turismo e Convenções da Grande Miami. Argentina, Colômbia, Venezuela e Chile também ficaram no topo da lista dos maiores gastadores, contribuindo com um total de US$ 2,6 bilhões para a economia da cidade.
Esse influxo, que coincide com o surgimento recente de eventos de alto nível como a mostra de arte contemporânea Art Basel Miami e uma nova leva de hotéis opulentos, está fazendo de Miami um grande destino de luxo. "Miami se tornou muito sofisticada sob vários aspectos", disse George Cozonis, gerente geral do W South Beach, uma mistura de hotel e condomínio onde um em cada dez apartamentos é de brasileiros - que também somam de 10% a 12% dos hóspedes do hotel, mais do que qualquer outra nacionalidade à exceção dos próprios americanos. Cozonis disse que o W faz um marketing pesado junto a agências de turismo brasileiras.
O requintado projeto, a poucas quadras da ferveção do maior reduto da vida noturna de Miami, foi inaugurado em 2009, no ápice da recessão no país. Mas "nunca sentimos para valer os efeitos da crise", disse Cozonis, o gerente geral. "Estivemos operando com capacidade total quase todo o tempo".
É verdade que, no passado, Miami já dançou ao ritmo vertiginoso da política e da economia latino-americanas, notoriamente instáveis. Mas promotores da região têm motivos para crer que essa nova onda, vista como sinal do grande avanço da América Latina como um todo rumo ao desenvolvimento real, será permanente. "A nosso ver, é mais sustentável do que foi no passado", disse Frank Nero, presidente da The Beacon Council, uma parceria de desenvolvimento econômico do condado de Miami-Dade. "Sob muitos aspectos, não é decorrência da fuga de capitais, mas da democratização contínua na América Latina."
A chegada dos latinos também está reavivando incorporadoras imobiliárias duramente atingidas quando a crise de 2008 fez o crédito secar. "Os latino-americanos estão financiando nossos novos projetos em Miami", disse Carlos Rosso, presidente-executivo da The Related Group, grande construtora de capital fechado com sede em Miami que, no momento, está erguendo seis condomínio de luxo no sul da Flórida.
Foram moradores endinheirados da América Latina que abocanharam o estoque de imóveis abandonado pelos americanos após o estouro da bolha imobiliária, disse Rosso. E o dinheiro do latino-americano é o sustentáculo de novos projetos - cujo metro quadrado ainda é mais barato do que em lugares valorizados como o Rio de Janeiro e São Paulo, disse. Recentemente, um apartamento de 3 quartos e 140 metros quadrados em Copacabana era anunciado por US$ 650.000; o preço de imóveis similares em Brickell, uma área nobre de grandes edifícios perto do centro de Miami popular entre latino-americanos, variava de US$ 375.000 a US$ 500.000.
Embora os bancos sigam com medo de investir em projetos imobiliários, muitos clientes latino-americanos estão dispostos a pagar grandes somas de entrada e prestações altas à medida que a obra avança, disse Rosso. Além disso, os bancos financiam a compra de imóveis na região por latino-americanos. Neil Brazil, porta-voz do HSBC, disse que, em geral, um financiamento desses exige entrada de 35% a 40% do valor do imóvel, algo parecido ao que muitos estrangeiros já pagam ao adquirir um imóvel em seu próprio país. Além disso, os juros são de um quarto a três oitavos de ponto percentual mais altos do que os pagos por residentes dos Estados Unidos.
O shopping Village of Merrick Park, onde a estilista venezuelana Carolina Herrera e a joalheria brasileira H.Stern têm lojas, fizeram acordos com hotéis de luxo como o Biltmore, em Coral Gables, para trazer consumidores brasileiros para eventos especiais. A loja da Tiffany & Co. no shopping e outra joalheria do grupo em Bal Harbour registram transações com valor médio superior ao da maioria dos outros estabelecimentos da empresa, pois a cidade atrai gente abastada das Américas Central e do Sul, explicou Henry González, diretor da Tiffany para Miami e o oeste da Flórida.
Outros empreendimentos de varejo de luxo pipocam cidade afora para atender visitantes da América Latina e de outros lugares - cada vez mais endinheirados. Uma noite dessas no Miami Design District, onde foi aberta uma loja temporária da Louis Vuitton em outubro, a grande maioria dos comensais no terraço de um restaurante famoso da área - o Michael's Genuine Food & Drink - era claramente da Venezuela, da Colômbia e do Brasil. No Aventura Mall, no extremo norte da cidade, uma nova ala de lojas de luxo está sendo abocanhada por varejistas rapidamente. Já o estilista britânico Alexander McQueen abriu uma nova loja em Bal Harbour, um dos centros tradicionais do comércio sofisticado de Miami.
O fluxo de latinos seguiu inabalável apesar da expressiva desaceleração da economia brasileira este ano. O número de brasileiros que aportaram em Miami cresceu ao ritmo de dois dígitos durante os primeiros seis meses de 2012, disse William Talbert, presidente da Secretaria de Turismo e Convenções da Grande Miami.
Parte da explicação é que está muito mais fácil para o brasileiro conseguir o visto de entrada nos EUA - o tempo de espera para entrevistas em consulados americanos no Brasil, que anos atrás era de quatro meses, caiu para apenas dois dias. Se o governo americano abolir a necessidade de visto para a admissão de brasileiros ao país, a exemplo do que faz com a maioria dos países desenvolvidos, o número de visitantes explodiria, disse Talbert.
"Os brasileiros continuam a viajar, a comprar apartamentos, a abrir negócios", disse.
 

Nenhum comentário:

Postar um comentário