A primeira casa que visitei nos Estados Unidos foi a do fundador e dono da Reader's Digest, um dos maiores sucessos da história da imprensa mundial e principal patrocinador da bolsa que me trouxe em 1968.
DeWitt Wallace era um republicano conservador, multimilionário e generoso contribuinte do governo Nixon.
A bolsa tinha sido criada no começo da década de 60 com objetivo de atrair jornalistas de tendências esquerdistas e "lavar" noções antiamericanas, dominantes no meu grupo.
A casa de Wallace ficava a uma hora ao norte de Nova York num cenário extraordinariamente rico e lindo, perto da sede da "Reader's Digest". Um paraíso e um choque cultural.
O presidente Reagan dizia que se conseguisse levar os líderes soviéticos para um passeio de helicóptero pelos afluentes subúrbios americanos destruiria o comunismo.
A segunda casa que visitei, três dias depois, durante a convenção do Partido Democrata em Chicago, me deu outro tipo de choque cultural.
Foi a "mansão" de Hugh Hefner, dono do império Playboy. Todas as noites, depois do gás lacrimogêneo, das pancadarias nas ruas entre a polícia e a juventude desatinada, dos tumultos da convenção, políticos, intelectuais e jornalistas enchiam as salas de Hefner que às vezes dava as caras com seu robe, pijama, chinelos de flanela e cachimbo.
As "coelhas" também estavam lá, mas não davam choque. Tão perfeitas e sorridentes, pareciam bonecas de plástico.
Hefner sempre se identificou com os políticos liberais, obamista devoto, convidou o presidente para visitar a mansão em 2008. Ele achava que a vitória de Obama traria o fim da religião em política. Não imaginava o Tea Party.
Na década de 70 passei dias na revista Playboy numa reportagem para "Manchete", estive na mansão de Los Angeles mas nunca entrevistei Hefner que hoje esta com 86 anos, obamista, saudável, casado com uma mulher 60 anos mais nova. A revista ainda circula.
Entrevistei o pornógrafo Bob Guccione na "mansão/apartamento" dele de 2.000 metros quadrados em Manhattan. Ele lançou a revista Penthouse na Inglaterra e, quatro anos depois, nos Estados Unidos.
Bombava na década de 70. Foi o primeiro a mostrar pentelhos mas a revista não vendia só pelo nu frontal. O conteúdo de reportagens era mais ousado do que Playboy com matérias dos melhores jornalistas investigativos sobre corrupção em Washington.
Guccione era um liberal democrata mas, com a revista em crise, no fim dos 90, tentou convencer Monica Lewinski a posar nua para a revista. Muito gorda.
Chegou a acumular uma fortuna de US$ 400 milhões, financiou filmes importantes e bem sucedidos como "Chinatown" e "The Day of the Locust" mas a pornografia de graça online matou a revista.
O império declarou falência em 2003. Ele foi afastado, empobreceu e morreu em 2010, com 79 anos de um câncer que começou na boca. A revista ainda circula.
Larry Flynt foi mais pornográfico que Hefner e Guccione e hoje é também conhecido como defensor dos direitos civis e da liberdade de imprensa.
Criador da revista "Hustler", continua ativo na pornografia e na política. Larry, que faz 70 anos na próxima semana, começou com um bar de strip-tease e em poucos anos tinha um harém de 300 dançarinas espalhadas pelas cidades de Ohio.
Suas provocações provocaram dezenas de processos, um tiro de um supremacista branco que o deixou paralítico da cintura para baixo, dramas familiares e um ótimo filme dirigido por Milos Forman, "O Povo contra Larry Flynt".
Larry mostrava muito mais do que pentelhos. A revista mostrou fotos de Jacqueline Kennedy Onassis nua, tinhas ensaios fotográficos sobre sexo entre paraplégicos, velhos, mulheres grávidas, grupal e com instrumentos eróticos.
Uma das principais batalhas legais dele foi contra o influente reverendo Jerry Falwell, um republicano conservador. Processou Larry por causa de uma charge que sugeria relações incestuosas entre o reverendo e a mãe.
Falwell pediu prisão por difamação e indenização de US$ 45 milhões. A decisão foi parar no Supremo com vitória do pornógrafo.
Desde então, os famosos e poderosos não podem processar cartunistas, artistas nem comediantes, por causa de insultos e deboche.
Graças a ele o humor não tem limite na mídia. Aqui. Fora dos Estados Unidos, a história pode ser diferente, como vimos na reação muçulmana sobre o vídeo de Maomé.
Larry passou vários dias na prisão quando compareceu a um tribunal usando a bandeira americana como fralda. Além de preso, foi multado pelo insulto mas recorreu e a decisão foi revertida.
A fralda foi um deboche menor e mais barato do que suas campanhas contra políticos e candidatos conservadores.
Clintoniano e irritado com a hipocrisia dos republicanos, ofereceu US$ 1 milhão a quem denunciasse transgressões conjugais dos que perseguiam o presidente.
Terminou a carreira de um senador e impediu o avanço de outros políticos.
A revista que chegou a vender 3 milhões de exemplares por mês, hoje circula com 500 mil. Larry Flynt faz fortuna com lojas de roupas e equipamentos eróticos, um cassino e uma rede de filmes pornográficos em 55 países.
Em setembro, Flynt comprou páginas no Washignton Post, USA Today (o The New York Tiimes recusou o anúncio) e jornais na Suíça, Cayman e Bermuda, oferecendo US$ 1 milhão a quem produza as declarações dos impostos de renda de Mitt Romney que revelou apenas duas, de 2010 e 2011, dos últimos 10 anos. Larry Flynt acha que o republicano é um bilionário com fortunas escondidas em paraísos fiscais.
Hoje, nem os mórmons, como Mitt Romney, levam choques culturais pornográficos, como mostrou um dos melhores seriados americanos sobre poligamia: Mas nos próximos doze dias, um choque fiscal surpresa de outubro, pode definir a eleição.
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